Onde estaríamos sem o plástico? Atualmente, o plástico é um dos materiais mais comuns que nos rodeiam. Tudo, da nossa roupa e calçado, passando pelos nossos locais de trabalho e sistemas de entretenimento, e terminando nos nossos carros e principais aparelhos, é feito de uma espécie ou outra de plástico, ou, mais habitualmente, de uma combinação de diferentes plásticos. Os plásticos também se encontram, muitas vezes invisíveis, nas infraestruturas das nossas cidades, por exemplo, em canos e tubos, isolamento de fios e materiais de construção. Se lhe retirássemos o plástico, a civilização parava. Ou não? Os nossos bisavós tinham embalagens plásticas para alimentos, ou leitores de MP3 e sacos de compras descartáveis, mas não degradáveis?

Como acontece com a economia do petróleo, a economia do plástico é um fenómeno relativamente recente. Muitos dos plásticos que hoje tomamos como garantidos foram inventados entre as duas Guerras Mundiais e só adquiriram a sua projeção atual na década de 1950. Os plásticos são sinónimo de uma sociedade de consumo descartável que seduz a Humanidade desde a década de 1960, e é aí que reside o principal problema. O seu fabrico é barato e, como tal, é um produto completamente descartável. Produzimos milhões de toneladas e a maior parte acaba no meio do ambiente, onde certos materiais, em particular aquele ao qual nos iremos dedicar neste artigo, podem demorar até mil anos para se degradar.

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Cometer erros

Um dos nossos plásticos mais familiares e versáteis, o politeno, ou mais popularmente, polietileno, foi fabricado pela primeira vez por acidente em 1898, pelo químico alemão Hans von Pechmann (1850-1902). A descoberta inicial de uma substância branca e cerosa no fundo de um tubo de ensaio não foi encarada como nada de transcendente e, como tal, foi rapidamente esquecida até que dois químicos ingleses que trabalhavam para o gigante da petroquímica Imperial Chemical Industries (ICI) repetiram as experiências de Pechmann no início da década de 1930. A produção inicial do polietileno começou em 1939.

O polietileno possui várias densidades diferentes, com uma ampla variedade de usos. A utilização mais conhecida do polietileno de muito baixa, baixa e média densidade é na embalagem de alimentos, sacos de plástico e película aderente; o polietileno de densidade superior pode ser encontrado em produtos mais resistentes, tais como as condutas de água e de gás, caixotes do lixo e embalagens alimentares.

Os oceanos tornaram-se a lixeira global. Viagem a um mundo que agoniza
créditos: Innay/Unsplash

Embora o polietileno seja um plástico reciclável, até há pouco tempo muito poucas das centenas de milhões de toneladas produzidas anualmente eram recolhidas. À semelhança da película aderente e das embalagens plásticas, os sacos de plástico são tão baratos que continua a ser mais rentável fabricar novos do que reutilizar os antigos. Como resultado, o polietileno acaba em aterros, no ambiente dos oceanos.

O problema dos sacos de plástico largados no meio ambiente é tão grave que muitos países do mundo adotaram medidas para limitar o seu uso.

Ao contrário dos plásticos mais recentes, o polietileno não é biodegradável, embora seja fotodegradável, ou seja, decompõe-se com a luz solar. Infelizmente, o processo pode demorar várias centenas de anos em condições secas e na água pode ser ainda mais lento, atingindo, por vezes os mil anos.

O problema dos sacos de plástico largados no meio ambiente é tão grave que muitos países do mundo adotaram medidas para limitar o seu uso, eliminando gradualmente os sacos gratuitos ou aplicando-lhes impostos. Uns quantos países, incluindo o Bangladesh, a Tanzânia, o Ruanda e a Somália, proibiram-nos por completo. Com a entrada em vigor de proibições em vários dos principais países europeus e na China durante os próximos anos, a era do saco de plástico descartável está finalmente a chegar ao fim. O seu legado, contudo, há de ficar connosco durante muito mais tempo – vários séculos, na realidade.

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A lixeira do globo

No final da década de 1980, investigadores da Administração Nacional Oceanográfica e Atmosférica dos EUA previram que grande parte dos detritos não biodegradáveis que estávamos a largar no oceano desde a Segunda Guerra Mundial haviam de acabar no giro do Pacífico Norte, um enorme vórtice criado pela rotação das correntes terrestres oceânicas. A confirmação desta previsão não tardou a chegar, quando Charles Moore, um iatista e oceanógrafo, deu de caras com o triste cenário ao regressar a casa via Pacífico Norte depois de participar numa regata. As estimativas quanto ao tamanho do “Grande Depósito de Lixo do Pacífico” variam entre os 700 mil e 15 milhões de Km2. Segundo Moore, 80% do lixo teve origem em terra e o restante foi despejado por navios no mar, intencional ou acidentalmente. Os detritos oriundos da Ásia demoram cerca de 12 meses a alcançar o depósito, enquanto os da costa oeste da América demoram cerca de cinco anos. Uma elevada concentração desses detritos é de plástico. Num estudo de 2002, os investigadores apuraram que a concentração de resíduos de plástico em certas áreas do depósito tinham atingido um milhão de unidades por cada 2,5 Km2.

O problema não se encontra limitado ao Pacífico; manchas semelhantes existem noutros oceanos e mares principais. As áreas costeiras mais movimentadas do Mediterrâneo revelam mais de 4000 itens por cada Km2: 77% eram plásticos, dos quais 93% eram sacos de polietileno.

plástico
créditos: Pixabay

O plástico degrada-se com o tempo, mas o que acontece é que ele apenas se decompõe em pedaços cada vez menores, os quais ficam suspensos nas camadas superior da água do mar, até se tornarem suficientemente pequenos para serem ingeridos pelos organismos aquáticos. Estas partículas de plásticos flutuantes, conhecidas como nurdles ou, mais romanticamente, como “lágrimas de sereia”, são tão pequenas que podem ser confundias com plâncton e ovas de peixe. Mas, qualquer peixe, ave ou réptil marinho que tenha a infelicidade de as comer morrerá de fome, visto que os nurdles lhe obstroem o aparelho digestivo, ou morrerá envenenado quando certas substâncias químicas vertem do plástico. Animais marinhos maiores, podem ingerir objetos maiores, como sacos de plástico inteiros, o que também pode provocar a inanição por obstrução do aparelho digestivo.

As estimativas quanto ao tamanho do 'Grande Depósito de Lixo do Pacífico' variam entre os 700 mil e 15 milhões de Km2.

Armada de patos

Há muito poucos motivos de risos no catálogo das terríveis consequências do nosso vício em plástico, mas de vez em quando surge algo que nos leva a sorrir. Em 1992, uma remessa de 28 mil Friendly Floatees (brinquedos de banho para crianças), com a forma de castores, sapos, tartarugas e patos, perdeu-se no mar durante o seu trajeto entre a China e os EUA. As caixas de cartão e de plástico nas quais os brinquedos tinham sido embalados rapidamente se desintegraram, permitindo assim que os diminutos exploradores iniciassem a sua odisseia pelos oceanos do mundo. Curtis Ebbesmeyer (n. 1943) e outros cientistas marinhos usaram este “derramamento” para uma melhor compreensão das correntes oceânicas e dos locais onde é provável que os detritos se acumulem e deem à costa. Foram necessários dez meses para que os primeiros Floatees chegassem à costa do Alasca, a cerca de 3200 Km de distância do ponto de partida no meio do Pacífico. Em 1996, tinham chegado à costa do estado de Washington. Outra flotilha destes pequenos brinquedos regressou à Ásia e de lá seguiu para norte através do Estreito de Bering, cruzando o Oceano Polar, onde ficou presa no gelo marinho durante vários invernos até ser lançada no Atlântico Norte. Os seus primeiros portos de escala foram a Nova Inglaterra e o Canadá, mas acredita-se que outro grupo esteja a caminho das praias inglesas.

Este artigo é um excerto do livro As Piores Invenções da História, da autoria de Eric Chaline e publicado em Portugal pela editora Marcador.


Eric Chaline é formado pela Universidade de Cambridge e pela Escola de Estudos Africanos e Orientais, em Londres, foi editor da Kodansha Publishers. Entre os livros da sua autoria podem encontrar-se títulos como Artes Marciais para Fitness e as Piores Deceções da História. Eric Chaline vive e trabalha atualmente em Londres.