Numa proposta a que a Lusa teve acesso, as organizações lembram o impacto da malnutrição para a pessoa com doença e também para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), pois prolonga os tempos de internamento e aumenta a necessidade de cuidados de saúde, as readmissões hospitalares e as despesas em medicamentos.
“Estamos numa altura de elevada inflação e estes produtos são de venda livre, o que significa que podem sempre aumentar de preço”, explica, em declarações à Lusa, Ana Sampaio, presidente da Associação Portuguesa da Doença Inflamatória do Intestino, Colite Ulcerosa e Doença de Crohn (APDI), uma das cerca de 20 que assinam a proposta, que será entregue à nova equipa da Saúde.
A responsável lembra que estes doentes “acabam por estar de baixa”, o que reduz a disponibilidade de rendimentos, com “um impacto muito grande no rendimento familiar”, e sublinha: “Há doentes a gastar 300 euros, mas há doentes a gastar 900 euros. Depende do produto”.
Conta ainda que, na tentativa de encontrar solução, muitas famílias “tentam fazer sopas bastante nutritivas”, que acabam por entupir as sondas e levar o doente para o hospital.
“Primeiro, isso não vai nutri-las, porque [estas sopas] não têm a mesma quantidade de proteínas e outro tipo de nutrientes que têm esses produtos. Para além disso, as sopas entopem as sondas e as pessoas acabam por ir para o hospital. Portanto, é uma pescadinha de rabo na boca”, explica.
Ana Sampaio alerta ainda que muitas famílias, “em desespero” por não conseguirem ter acesso a estes produtos, acabam por “ir para a net procurar soluções”, aumentando o risco em termos de segurança, e lembra que, nalguns casos, como os doentes com esclerose lateral amiotrófica, esta é “a única possibilidade [de nutrição] que têm no fim de vida”.
“É um bocadinho injusto perceber que o Estado não comparticipa estes produtos a estas pessoas pois, muitas vezes, é uma questão de sobrevivência”, acrescenta.
Na proposta que vão apresentar à tutela, a que a Lusa teve acesso, as associações lembram que o elevado custo da nutrição entérica em ambulatório “limita o acesso” às pessoas que dela precisam, com “consequências significativas na qualidade de vida e tratamento da doença-base e aumento dos custos para o SNS”.
Ana Sampaio recorda que muitos destes doentes “estão a fazer terapêutica inovadora, que é muito cara, e que se eles não estiverem bem nutridos não é absorvida”.
A proposta sugere o financiamento público destes produtos, na forma de suplementos orais ou fórmulas para nutrição entérica por sonda “quer constituam a única fonte alimentar ou um substituto parcial ou suplemento de regime alimentar das pessoas a que se destinam”.
Sugere a comparticipação em todas as idades e nas patologias que já estão definidas por uma norma da Direção Geral da Saúde, que inclui, entre outras situações, doentes com necessidades de nutrição por sonda por alterações da ingestão alimentar provocadas por doenças neurológicas, acidente vascular cerebral, anorexia, obstrução da orofaringe ou esófago devido a tumores, doenças inflamatórias do intestino ou casos de aumento de necessidades nutricionais, como, por exemplo, no pós-operatório.
A proposta sugere que estes produtos, para serem comparticipados, sejam prescritos nas instituições do SNS e possam ser dispensados nas farmácias de rua.
As associações lembram o impacto que a malnutrição tem para a pessoa com doença, aumentando em 19,3% o risco de complicações no internamento, prolongando o internamento em 30% ou aumentando em 12 vezes a mortalidade global.
O impacto nos serviços de saúde também é destacado: aumento de 15% nas readmissões hospitalares, de 65% nas consultas nos cuidados de saúde primários, tempos de internamento mais longos, maiores cuidados de enfermagem e mais despesas em medicamentos.
Segundo as organizações, estima-se que, anualmente, mais de 114 mil doentes em risco nutricional ou malnutridos na comunidade possam necessitar de apoio nutricional.
Apontam ainda um estudo que indica que, em 2020, as despesas das famílias com estes produtos rondaram os nove milhões de euros e, em 2024, a estimativa aponta para uma despesa de 12 milhões de euros.
O investimento/financiamento pelo SNS “corresponderia a menos de 0,1% do Orçamento do Estado para a Saúde”, recordam.
“É uma questão mesmo de se entender que isto é um investimento e que vai trazer retorno certamente para a saúde e um alívio para as famílias”, insiste a presidente da APDI.
Além da APDI, a proposta é subscrita, entre outras, pela Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, APELA - Associação Portuguesa de Esclerose Lateral Amiotrófica, Associação Portuguesa de Neuromusculares, Associação Nacional AVC, EVITA – Associação de Apoio a Portadores de Alterações nos Genes Relacionados com Cancro Hereditário, Europacolon Portugal, Liga Portuguesa Contra o Cancro e Liga Portuguesa Contra a Sida.
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