Em causa está a alegada prática dos crimes de burla qualificada e falsidade informática, em coautoria, segundo o despacho de acusação consultado pela agência Lusa.
O Ministério Público (MP) sustenta que se registou a introdução num programa informático de duas farmácias do concelho de Porto de Mós, das quais a farmacêutica era diretora técnica, de medicamentos comparticipados que não vendeu, para obter comparticipação do Serviço Nacional de Saúde (SNS), causando um prejuízo ao Estado de cerca de 100 mil euros.
Na sessão de hoje, o Ministério Público pediu o adiamento da sessão, por ausência da arguida, considerando que a sua audição, caso pretenda prestar depoimento, poderá ser importante para a descoberta da verdade. No entanto, o coletivo de juízes entendeu que a acusada poderá prestar declarações noutra sessão, pelo que o julgamento prosseguiu.
Segundo uma das testemunhas, a arguida, assim como a filha e funcionárias, iam a uma farmácia de Leiria aviar medicamentos que eram 100% comparticipados pelo Estado. A receita era prescrita pelo marido da arguida, médico de profissão que, segundo uma farmacêutica que trabalhou com a arguida, tinha um consultório privado.
“Iam quase todos os dias à minha farmácia. Quando vi a quantidade de receitas de medicamentos cuja participação é paga na totalidade denunciei à Ordem dos Farmacêuticos. Pareceu-se um exagero serem sempre os mesmos medicamentos. As receitas normalmente tinham o nome da mulher [arguida] do médico que a prescrevia”, adiantou a testemunha, então proprietária de uma farmácia em Leiria.
A testemunha considerou que “não havia justificação médica para tantas receitas de insulina”.
“Sei o tempo que demora a terminar uma caixa”, disse.
De acordo com uma farmacêutica que trabalhou nas duas farmácias da arguida, é “normal pedir um medicamento emprestado a outra farmácia, quando o mesmo está indisponível momentaneamente e depois quando é reposto devolve-se”.
No entanto, acrescentou esta testemunha, “não são aviadas receitas noutras farmácias”.
A testemunha referiu ainda que “era possível introduzir manualmente o número dos medicamentos, como se tivesse havido a dispensa total dos mesmos”.
De acordo com o despacho do Ministério Público (MP), “em data não concretamente apurada, mas contemporânea ou anterior a 01 de janeiro de 2012”, a arguida, “conhecedora do funcionamento do programa informático de gestão e faturação SIFARMA2000”, instalado nos estabelecimentos, “decidiu que iria introduzir também nesse programa a identificação de medicamentos comparticipados que não havia vendido como se os mesmos tivessem sido vendidos”.
O objetivo era “obter comparticipação” do SNS “daqueles medicamentos que não vendeu, tendo em vista suprir vendas suspensas e não regularizadas, cuja comparticipação a sociedade arguida não tinha direito”, adiantou a acusação.
O MP explicou que, na execução de um plano previamente gizado, a farmacêutica foi introduzindo no programa a venda de medicamentos que as farmácias não venderam, situação que terá ocorrido entre 2012 e 2016.
Ainda na sequência do plano, a arguida, através da introdução, no programa SIFARMA, de vendas de medicamentos que não correspondiam a qualquer transação, produziu documentos que titulavam, igualmente, vendas inexistentes comparticipadas pelo” SNS, referiu o MP.
Depois, a farmacêutica foi apresentando ao Centro de Conferência de Faturas aqueles documentos produzidos pelo sistema SIFARMA2000, reclamando, desta forma, o pagamento do valor da comparticipação do Estado.
A acusação sustentou que obteve, por si e em representação da sociedade arguida, ilegitimamente, o pagamento de tais comparticipações por parte do Estado português no valor global de 101.668,01 euros”.
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