De uma forma geral, estudarmo-nos a nós próprios e captar os pequenos sintomas que alguém nos provoca nestes casos irá ajudar-nos a discernir o que nos convém mais ou menos. Em pessoas extremamente sensíveis, a linha que separa uma simples fricção de uma relação nefasta pode ser muito ténue. É bom que conheçamos, que aprendamos com os erros e que, de vez em quando, analisemos o nosso comportamento e o modo como nos relacionamos com os outros.

Há certas características comuns nos tóxicos universais que nos podem ajudar a identificá-los – e a evitar que nos tornemos num deles. Costumam ser egoístas, negativos, invejosos, vítimas, amargurados, críticos, manipuladores, dependentes, dramáticos. Analisemos cada uma dessas facetas.

O egoísta

Chamo-lhes “espelho meu”. A vida delas começa e acaba nelas próprias. Eu, meu, a mim, comigo. Só se pode fazer o que elas querem. Precisam de ser o centro das atenções em todas as conversas. Têm dificuldade em ser empáticas, colocar-se no lugar dos outros e perceber os problemas à sua volta. Não ouvem, porque as dificuldades dos demais não lhes interessam. Viver próximo de um egoísta-espelho pode ser esgotante, pois no fundo o que desejam é que nos lembremos de que são eles o centro da nossa atenção. Querem ser os protagonistas da nossa vida, das nossas refeições, encontros e conversas.

O negativo

O famoso “não é não”. São as pessoas que se queixam constantemente. Veem sempre o copo meio vazio. Têm uma visão dramática e pessimista do ambiente à sua volta. Têm o SRA – Sistema de Ativação Reticular Descendente – negativo, com um filtro escuro que as impede de desfrutar e perceber as coisas boas da vida.

Qualquer coisa ou pessoas as aborrece: o seu companheiro, a temperatura, a comida, o trânsito, o governo e o mundo em geral. Custa-lhes imenso admitir uma boa notícia, ou algo que corra bem. Se o leitor tem alguém desse género por perto, afaste-se e mantenha a distância, porque poderá vir a sofrer, com frequência, ataques que não merece, mas que o poderão deixar perturbado. Dá a sensação de que culpam os outros pelos seus problemas e custa-lhes a aceitar que as coisas possam correr bem às outras pessoas. Isso irrita-os profundamente e demonstram-no com o seu mau humor. Se estiver perto desse tipo de pessoa, notará que se sente incomodado, inseguro e ansioso.

negativo
créditos: Maria Lysenko/Unsplash

O invejoso

Este é um traço muito frequente das pessoas tóxicas. Sofrem quando a vida corre bem aos outros e, por isso, sentem a necessidade de os criticar e desvalorizar. Assim pode surgir o desprezo, o insulto, a humilhação.

No fundo, estas pessoas costumam ser inseguras, característica que ocultam com esta atitude invejosa. É por essa razão que não se alegram com os sucessos dos outros. Como medida “defensiva” tendemos, inconscientemente, a esconder os nossos êxitos para não provocar a sua rejeição.

A vítima

Tem sempre uma desculpa para tudo. Da sua perspetiva, a sua vida é um drama e ocupa um papel de vítima em tudo o que acontece. Isto acaba por gerar nos outros um sentimento de culpa, do qual se irá aproveitar: abusa do tempo e da boa-fé dos outros, e aproveita-se de qualquer situação para pagar menos, conseguir favores ou que lhe ofereçam coisas. Aliada a esta, vem uma outra característica especialmente desagradável: a de não estar disponível quando alguém precisa, realmente dela.

Costuma, igualmente, culpas os outros pelos seus contratempos, o que, a longo prazo, poderá criar problemas de autoestima na outra pessoa.

O amargurado

As pessoas amarguradas apagam-nos a luz que temos dentro de nós. Numa questão de minutos, conseguem encher de tristeza o nosso coração e a nossa mente. Arrastam um halo de tristeza que nos contagia quando estamos perto delas. Muitas precisam de ajudar porque estão num processo depressivo ou têm uma história de vida marcada por grandes feridas, que deverão ser tratadas com carinho.

Esse carácter amargurado vai-se alimentando a si próprio, já que, por não ser atraente, faz com que o indivíduo se vá isolando e contado com cada vez menos pessoas à sua volta, o que acabará, no final, por o fazer sofrer um enorme desgaste psicológico.

amargura
créditos: Malicki M Beser/Unsplash

O que julga

Tem sempre uma palavra para comentar a nossa vida, a nossa relação conjugal, a educação que damos aos filhos, o nosso aspeto físico ou o nosso trabalho. Sente-se no dever de opinar sobre tudo o que tenha a ver connosco, normalmente sem limites e roçando a má educação, magoando-nos, fazendo-nos sentir diretamente agredidos. A sensação que temos é a de estarmos constantemente a ser repreendidos. Ocorre com frequência na relação com os pais que mantêm o costume de “educar”, quando já passou a fase da vida em que seria normal fazê-lo.

Todos temos defeitos. O facto de alguém nos corrigir – mesmo que seja com carinho – provoca mal-estar. É muito difícil e requer muito tato e delicadeza corrigir uma pessoa sem a ferir. Este tipo de pessoa reprova constantemente e analisa o nosso comportamento. No início de uma relação, há que prestar atenção a este género de atitudes, porque sentimo-nos julgados e observados a toda a hora provoca uma dinâmica muito perigosa para a dinâmica do casal, uma vez que ativa o estado de alerta e nos impede de descansar e desfrutar da vida.

O que critica

Todos conhecemos alguém assim. É o tipo de pessoa que tem sempre uma palavra negativa sobre outra pessoa, quando a vemos ou lhe telefonamos. A sua vida é como um Big Brother sobre a vida dos outros, incansavelmente atenta às suas falhas e erros.

Quando estamos perto dessas pessoas que criticam, o nosso sistema de alerta entra em ação, o cortisol e outras reações físicas deixam-nos tensos e esse estado de tensão desgasta-nos. Atenção, se o leitor tende a ter esse tipo de comportamento! Quando uma pessoa não se sente realizada com a vida que tem, mas antes insegura ou vazia, é muito provável que decida entrar no mundo da crítica fácil.

Porque deixámos de escutar os outros? Jornalista visitou cinco continentes para encontrar a resposta
Porque deixámos de escutar os outros? Jornalista visitou cinco continentes para encontrar a resposta
Ver artigo

Costumo explicar que existe uma crítica interna, que é aquela que surge na nossa mente de cada vez que conhecemos ou nos cruzamos com alguém. Depois, há a crítica externa, que é a que partilhamos com outros. A interna tem um efeito muito prejudicial no organismo, pois a forma como falamos connosco tem um impacto direto na nossa saúde. A externa, a que comunicamos aos demais, tem um duplo efeito pernicioso: prejudica-nos a nós próprios e, adicionalmente, intoxicamos o ambiente e o equilíbrio fisiológico dos que nos rodeiam.

Alguns acham que ao criticar se conseguem ligar a outros porque em conversas iradas, no meio de invejas ou bisbilhotices, também podem surgir pontos de vista em comum e risos, mas atenção, a linha que separa o “divertido” do “tóxico” é extremamente ténue.

O manipulador

É alguém que tem ascendência ou influência sobre si. Pode ser companheiro, pai, chefe ou amigo. Costumam ter uma memória prodigiosa, por reterem informação e dados de que possam necessitar, para o poderem atacar ou levar a fazer algo que desejam.

Enquanto não estamos conscientes da manipulação a que somos submetidos não sofremos propriamente, mas quando nos apercebemos de que fomos manipulados, e decerto em inúmeras ocasiões, sentimo-nos traídos, pequenos e vulneráveis, com a nossa autoestima e confiança em nós próprios seriamente abaladas.

mentiras
créditos: Annie Spratt/Unsplash

O dependente

São pessoas que sentem uma necessidade tão intensa de outra pessoa que acabam por escravizá-la e negar-lhe o seu próprio espaço e liberdade. Como é evidente, uma coisa é o dependente que, por razões objetivas, não pode valer-se a si mesmo – que não é o caso de que agora falamos -, e outra bem diferente é aquele que força a situação por ter um comportamento patológico.

Controlam tudo o que fazemos, pretendem constantemente fazer parte da nossa vida e não suportam a ideia de que possamos ter uma vida independente da deles. Este comportamento provoca um enorme desgaste e uma forte sensação de aprisionamento. Estes indivíduos não hesitam em recorrer à chantagem emocional para evitar que nos desliguemos deles. Apercebermo-nos disto ajudar-nos-á a gerir a situação de forma saudável.

O put drama in your life

Há uns anos, vi um anúncio espetacular num canal de televisão belga. Numa pequena povoação, em que nada acontecia, colocaram no meio de uma praça um botão com o seguinte aviso: “carregue, para acrescentar drama/ou suspense”). Assim que o botão era pressionado, começavam a acontecer todo o tipo de coisas, num curto espaço de tempo. Alguns minutos depois, a vida da pequena povoação voltava à sua calma habitual. Este anúncio, que por vezes apresento nas sessões de terapia, serve-me para explicar a muitos dos meus pacientes este conceito tão interessante que eu denomino “pessoas put drama in your life” (pessoas “acrescentam drama à tua vida”). São aqueles que procuram incessantemente, inventam se não existir e, por fim, desfrutam de um conflito. É como se, de certa maneira, fossem viciados em situações em que existe uma componente dramática ou até mesmo trágica. Conviver com uma pessoa assim é como atravessar um campo de minas.

Talvez a pessoa padeça de uma perturbação estado-limite (border-line) de personalidade, tenha traços histriónicos, ou sofra de ansiedade e a canalize sob a forma de agressividade. Vive em constante estado de alerta, o que a leva a fugir e a aborrecer-se com frequência. Têm pouca tolerância à frustração, vivem numa continua busca por problemas, reais ou inventados, e, de acordo com a sua perceção, os outros são sempre culpados de tudo. Se já conheceu alguém assim, sabe perfeitamente a que me refiro.

São especialistas em desestabilizar o ambiente à sua volta, numa questão de segundos. Alteram o equilíbrio familiar e muitas vezes provocam, com maior ou menor subtileza, disputas entre familiares ou entre cônjuges.


O artigo apresentado é um excerto do livro Encontre a Sua Pessoa Vitamina (edição Planeta), escrito pela psiquiatra espanhola Marian Rojas Estapé, obra que nos revela de forma clara e simples como nos podemos rodear de “pessoas vitamina”, aquelas que nos inspiram, nos fazem bem e incentivam. Também nos explica como encontrar a vitamina que todos possuímos dentro de nós. A autora analisa o amor, a infância e os afetos do ponto de vista científico, psicológico e humano.