Em declarações à agência Lusa, o investigador responsável, Pedro Morgado, sublinhou a importância do prémio, o maior na área da saúde mental em Portugal, apontando a escassez de fundos para este tipo de investigação aplicada e que procura resolver problemas já na fase clínica das doenças.
“Temos muita investigação básica, que procura perceber o mecanismo das doenças, mas é depois difícil a investigação aplicada em Portugal. E é um salto muito importante”, afirmou.
Psiquiatra do Hospital de Braga e professor e investigador da Escola de Medicina da Universidade do Minho, Pedro Morgado destacou ainda que o prémio atribuído pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) vai permitir à equipa desenvolver o projeto em parceria com uma universidade norte-americana.
“Será feito em colaboração com uma equipa sediada na Universidade de Nova Iorque, liderada pela professora Emily Stern, que tem também muita experiência em ensaios clínicos em doentes com perturbação obsessivo compulsiva”, acrescentou.
O investigador explicou que a perturbação obsessivo-compulsiva afeta em Portugal cerca de 4% das pessoas e provoca “um enorme sofrimento a estes doentes”.
“É muito significativa e caracteriza-se por um enorme sofrimento e um impacto brutal na qualidade de vida, porque as pessoas experienciam pensamentos obsessivos que são intrusivos, que aparecem na cabeça delas contra a sua vontade, contra a sua natureza”, disse.
Pedro Morgado disse que esta perturbação leva à adoção de comportamentos repetidos, “que não servem para mais nada a não ser aliviar o sofrimento”, dando o exemplo de pessoas que lavam repetidamente as mãos ao logo do dia e evitam tocar em coisas ou cumprimentar outras pessoas, por acharem que estão sujas ou por medo de contaminarem alguém.
“Esta doença pode consumir o dia todo das pessoas. Há pessoas que sofrem esta doença e que têm formas muito graves e muito difíceis de controlar”, acrescentou.
O especialista explicou ainda que, no tratamento, são usados antidepressivos e psicoterapia, mas nem sempre se consegue o efeito desejado.
“Conjugadamente, os antidepressivos de primeira linha, que são aqueles mais modernos e com menos efeitos secundários, produzem melhorias em mais ou menos metade das pessoas. Para a outra metade, temos de usar outro tipo de fármacos, que são antidepressivos mais antigos, antipsicóticos e, mesmo utilizando estes fármacos, temos um número muito grande de pessoas que continua com sintomas importantes, apesar do tratamento”, afirmou.
É precisamente para tentar encontrar uma solução para estes casos que este projeto, além de tentar com imagens de ressonâncias magnéticas perceber a resposta de cada pessoa ao tratamento (envolvendo até 100 pessoas), prevê um ensaio clínico com um fármaco que em Portugal está autorizado para a doença de Parkinson.
“Queremos, através da ressonância magnética funcional, identificar marcadores que, logo no início do tratamento, nos ajudem a selecionar melhor o antidepressivo que funciona para cada pessoa. É uma forma de personalizar o tratamento e, assim, ganhar tempo”, explicou Pedro Morgado, acrescentando que o ensaio clínico, com 50 pessoas, decorrerá no Centro Clínico Académico de Braga, sediado no Hospital de Braga.
Neste ensaio, de forma aleatória, umas pessoas receberão o fármaco usado para a doença de Parkinson e outras receberão um dos medicamentos que é usado com frequência nas situações de resistência ao tratamento da perturbação obsessivo-compulsiva.
“Vamos comparar e ver qual resulta melhor”, disse o investigador, acrescentado que em estudos pré-clínicos em modelos animais fármacos da família daquele que é usado na doença de Parkinson ajudaram a reduzir os sintomas e que outros estudos no Reúno Unido mostraram que alguns sintomas melhoraram com uma única toma.
Explicou igualmente que o fármaco usado habitualmente na doença de Parkinson e que vai ser testado no ensaio atua na dopamina e que os tratamentos de primeira linha para a perturbação obsessivo-compulsiva atuam na serotonina: “Parece que quando conjugamos estas duas atuações podemos melhorar as pessoas que não respondem aos antidepressivos da serotonina”, afirmou.
Ambas as tarefas decorrerão em simultâneo e vão decorrer ao longo de três anos.
O FLAD Science Award Mental Health é um apoio inédito a jovens investigadores em Portugal para desenvolverem novas linhas de investigação clínica em Saúde Mental, desde a prevenção até ao tratamento e à reabilitação.
A iniciativa tem o reconhecimento da ministra da Saúde, Marta Temido, da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
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