A saúde mental começou a ter destaque e a ganhar voz há relativamente poucos anos. No entanto, apesar do aumento da consciência da importância desta temática, a saúde mental é ainda assombrada por alguns mitos e tabus, muitos deles bastante difundidos. A psicologia e o papel do psicólogo continuam a ser muito questionados, e estas questões surgem na maioria das vezes, por falta de informação.

A Psicologia é uma ciência recente e a Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), enquanto associação que representa a classe profissional e regula a sua atuação, foi criada há apenas 12 anos. A OPP tem feito um trabalho exemplar na desmistificação de alguns desses mitos, contudo, para mim, o papel do psicólogo, é auxiliar essa luta no dia-a-dia, consciencializando a população e informando os demais. Daí o surgimento deste artigo, respondendo à dúvida de muitos: qual a diferença entre psicologia e psiquiatria na sua atuação clínica.

Primeiro devemos compreender o que é a Psicologia, antes de podermos distingui-la da Psiquiatria. A palavra Psicologia deriva de duas palavras gregas psyque (mente) e logos (estudo ou conhecimento) e como o seu nome indica, esta é a ciência que se dedica ao estudo da mente e do comportamento nos vários domínios da vida humana.

A Psiquiatria é um ramo da Medicina que se dedica ao estuda das perturbações mentais. As duas são bastante semelhantes no que respeita à área de trabalho: a mente humana. Contudo, bastante diferentes na forma de atuação.

A psiquiatria tem um objetivo principal de atuar sobre os sintomas atuais, aspetos biológicos ou desregulações neuroquímicas, realizando diagnósticos e utilizando a prescrição de medicação como tratamento.

A psicologia atua nas causas e processos do problema que deram origem ao sintoma. O Psicólogo usa instrumentos e técnicas cientificamente estudados para avaliar e intervir com cada pessoa, ajudando-a a lidar com as suas dificuldades. Os objetivos serão sempre atuar nas dificuldades atuais, nas queixas, e potenciar através do autoconhecimento e consciência dos processos, um desenvolvimento mais ajustado. A consulta de psicologia baseia-se num estudo intensivo de como cada mente funciona, quais os processos, os padrões de pensamento e comportamentos disfuncionais, com foco na mudança.

Grande parte da consulta de psicologia acontece através do diálogo. Mas esta não é uma simples conversa. Todo o processo terapêutico é um processo direcionado para objetivos e toda a sessão é guiada pelo profissional de uma forma ponderada e estruturada para os atingir. Ao longo das sessões, através de uma relação colaborativa, o terapeuta e cliente trabalham para atingir os objetivos definidos pelo cliente ao longo do processo.

Então qual é melhor?

Nenhum é melhor que o outro, aliás, na maioria das vezes são complementares.

Por um lado, a medicação ajuda a estabilizar e cria um espaço mais calmo para, através da psicoterapia, ser possível apostar na mudança psicológica e crescimento. Por outro lado, a psicoterapia, permite que os sintomas “adormecidos” pela medicação não surjam, tratando as suas causas, para que possam, não só, enfrentar estas dificuldades mas também aprender a fazê-lo no futuro. No fundo, o processo psicoterapêutico funciona como um treino emocional e relacional, onde a pessoa aprende novas formas de interagir consigo e com os outros, com impacto a longo prazo.

Todavia, é necessário tomar consciência da existência de patologias ou disfunções psicológicas e disfunções neurológicas. Nenhum psicólogo ou processo terapêutico vai curar um Parkinson, uma esquizofrenia ou um processo demencial. No entanto não quer dizer que a consulta de psicologia não seja benéfica para a aquisição de estratégias importantes para aumentar o seu bem-estar, mesmo que o tratamento necessário seja o farmacológico.

Por outro lado, existem as patologias da mente, mais focadas na forma disfuncional de pensamento ou comportamento, muito afetadas pelas nossas experiências negativas  onde a mente pode ter sido afetada, gerando sofrimento na forma como aprendemos a viver a vida. Como exemplos, temos a depressão, a ansiedade, as fobias... em que a psicoterapia é a única forma de tratamento efetivo.

Na maioria dos casos, a utilização da medicação sem a componente terapêutica poderá não ser suficiente, uma vez que ao longo do processo de melhoria, a medicação for retirada, os sintomas regressam.

Os tratamentos de primeira linha continuam a ser os farmacológicos, devido a fatores económicos muitas vezes, e à necessidade de uma resposta imediata que exija menos esforço. Contudo, esta decisão é muitas vezes baseada na falta de informação, fazendo com que Portugal seja o 5º país da OCDE com o maior consumo de ansiolíticos e antidepressivos. Tendo disparado as vendas desde o início da pandemia. Fazendo com que tratamentos de curto prazo estejam a ser utilizados como tratamentos vitalícios.

Um artigo da psicóloga clínica Sara Cruz.