O conceito de narcisismo provém da mitologia grega e da narração da história do jovem Narciso que se apaixonou por si mesmo quando a sua imagem foi refletida na água. Numa primeira análise poder-se-á entender o narcisista como alguém com amor próprio e, por conseguinte, revestido de uma caraterística de personalidade desejável por qualquer pessoa.
O conceito de amor próprio adequado envolve a construção subjetiva que a pessoa faz de si e é considerado um importante indicador de saúde mental, também relacionado com o sentimento de autoconfiança e segurança, por conseguinte, essencial na formação de um ser emocionalmente equilibrado.
Segundo o psicólogo Craig Malkin, o narcisismo “é a capacidade de nos vermos a nós mesmos e aos outros através de óculos cor-de-rosa”. Por conseguinte, determinado grau de narcisismo faz-nos bem e é fundamental.
No entanto, diferentemente da história mitológica, quando nos referimos a alguém como sendo narcisista significa que essa pessoa, com significativas dificuldades na regulação da autoestima, apresenta uma perturbação da personalidade narcisista, com investimento exagerado na sua própria imagem e com comprometimento do amor próprio.
Grandiosidade e autoexaltação são as palavras que melhor definem o narcisista. Vê-se como superior, especial e único, e dono de um singular status que o eleva acima de todas as outras pessoas. Procura prestígio, poder, riqueza e posição para reforçar continuamente a sua imagem superior.
Paradoxalmente, por detrás das fantasias de sucesso e de supervalorização esconde inseguranças e sentimentos de inferioridade. Quando não tem o reconhecimento, a admiração ou a validação da sua magnificência, entristece, sente-se infeliz ou, mesmo, deprimido. Quando experiencia a frustração, é criticado ou vive situações de insucesso, facilmente desmorona. Baixos níveis de autoestima, autoimagem distorcida e instabilidade emocional fazem parte dos sentimentos que o perturba e que tenta ocultar.
No dia-a-dia com uma pessoa narcisista
Viver com um narcisista patológico não é tarefa fácil. Requer, inúmeras vezes, aceitar a manipulação, fazer cedências emocionais e comportamentais em prol de quem exige centralização em si próprio, no que são as suas necessidades, expetativas e desejos. Mas nem sempre terá sido assim: no início de uma relação, o narcísico deslumbra com a sua atenção e personalidade sedutora. Contudo, e por fragilidade dessa estrutura, distancia-se desse funcionamento para se reencontrar com o seu verdadeiro Eu.
Regra geral, quem vive num relacionamento estreito ou íntimo com alguém com esta perturbação sente que ama substancialmente mais do que é amado. Devido à (quase) ausência de empatia que caracteriza a pessoa com perturbação da personalidade narcisista, esta tem muita dificuldade em colocar-se no lugar do outro, de entender pontos de vista diferentes do seu, e de sentir a dor ou o sofrimento alheio. Os seus problemas e visão sobre tudo e todos devem merecer total atenção e predominam sobre o universo das suas relações.
Quando procurar ajuda para a pessoa narcisista?
Resumidamente, sempre que os traços de personalidade sejam de tal forma marcados e suficientes que preencham o diagnóstico de perturbação de personalidade, condicionando ou impedindo de ter qualidade de vida. Simultaneamente, quando acarreta impacto negativo nas relações intra e interpessoais, e sem que o narcisista ou quem com ele convive, encontrem estratégias eficazes para lidar com os sintomas e/ou com o sofrimento associado.
A realidade mostra-nos que, por norma, são as vítimas dos narcisistas que reconhecem (e bem, felizmente) a necessidade de acompanhamento psicológico, em resultado do sofrimento que têm e para sobreviverem à toxicidade da relação.
Procurar ajuda para o narcisismo patológico é, com certeza, uma atitude de narcisismo saudável e desejável.
As explicações são da psicóloga clínica Lina Raimundo.
Comentários